quarta-feira, 23 de novembro de 2011

TIQUES MANIQUEÍSTAS


Portugal é um país de “feios, porcos e maus” em oposição ao grupo dos virtuosos. E todos são uma coisa e outra, conforme o lado da barricada em que se encontra o protagonista da história. O observador olha os outros como “feios, porcos e maus” e desconfia deles. E quem são estes feios pigs mal cheirosos?  
São agora os funcionários públicos que, encostados ao emprego para a vida e aos subsídios, não querem trabalhar, reclamam sempre que lhes apontam metas para cumprir tarefas e transformam o Estado num odre obeso, inchado, parasitário e paralisador da economia.
São os patrões e empresários que exploram os trabalhadores e os esmifram até ao tutano, fogem aos impostos e contribuições, são unhas-de-fome no que toca a salários e se puderem despedem os pobres trabalhadores por “dá cá aquela palha”.
São os trabalhadores que chulam os patrões, bufam nas suas costas, reivindicam direitos que a lei lhes consagra sem querer saber da sanidade da empresa ou entidade que lhes dá emprego e prontos a morder a mão de quem lhes dá de comer e a fazer greves
São os políticos e governantes que desgovernam o país e se governam a eles com os dinheiros públicos, fazem as políticas à medida dos seus interesses e dos lobbies que os apoiam, gastam à tripa-forra para ganharem votos e estão-se nas tintas para o borra-botas do Zé Povinho.
É o povinho que é boçal e ignorante, esse papalvo abstencionista que só gosta de novelas e de futebol e não percebe nada de política, que se mete nos copos, só diz baboseiras e bate punhetas às sextas-feiras, depois de uma semana desinteressante e na perspectiva de um fim-de-semana mais desinteressante ainda.
São os banqueiros, agiotas especuladores e oportunistas que enriquecem a poder de negociatas, usufruem de salários milionários riem-se dos pelintras e ainda lhes levam o couro e o cabelo quando não têm dinheiro para pagar os empréstimos, e dão de frosques quando as coisas vão para o torto na instituição bancária onde se espojaram durante anos a fio.
São os “justiceiros” deste país que não prendem quem deveriam, adormecem de propósito em cima dos processos e tornam a justiça uma velha virulenta mais parecida com uma bruxa de que todos se vêm impelidos a fugir para bem longe.
São os grupos corporativos, que se arrogam de plenos direitos no que toca aos seus interesses pequeno-burgueses ou aristocráticos e berram e vociferam como animais ferozes, de dentuça arreganhada, prontos a devorar qualquer cordeirinho que se lhes atravesse no caminho.
São os sindicalistas, esses espantalhos aventesmas sem imaginação, com cheiro a mofo e tresandando a cânfora para prevenção das traças que já os deviam ter comido há muito, filados à greve como o cão a um osso. A greve á a sua bandeira e não têm outro objectivo na vida que somá-las no seu curriculo.
Em resumo, num país deprimente e maniqueísta, dividido, onde o mérito de pouco serve, a justiça é palavra vã, o oportunismo é tido como coisa normal e o trabalho é coisa para inglês ver, é um país onde assenta bem a greve de amanhã. Esta será a forma de luta adequada para afundar o país ainda um pouco mais e acirrar os ânimos uns contra os outros. Além disso é um direito legítimo dos trabalhadores. É disso mesmo que o país precisa para continuar a sua saga de país maniqueísta, pelintra, endividado e de mão estendida.
Como nota final, compreendo a revolta e a indignação de muita gente mas sou de opinião que esta greve assume a forma mais inútil e simplista de uma luta que não passa de uma reivindicação inóqua, já que o Estado está falido o país endividado até às orelhas. Parece-me que não é desta forma que sairemos do atoleiro mas sim com trabalho, racionalidade nos gastos, organização, rigor e cooperação entre todos os sectores da sociedade, sem maniqueímos.   

domingo, 13 de novembro de 2011

A CULTURA “DAS LUVAS” E A JUSTIÇA DOS PODEROSOS

Estive a elencar uma série de casos mais mediáticos que chegaram à barra dos tribunais portugueses relacionados com corrupção, fraude fiscal, participação em negócio, branqueamento de capitais, peculato.
Refiro por exemplo casos como o FREEPORT, PORTUCALE, BPN, APITO DOURADO, FACE OCULTA, FÁTIMA FELGUEIRAS, ISALTINO MORAIS, VALE E AZEVEDO, OPERAÇÃO FURACÃO para citar os que me lembro mais recentes, e verifico que em todos eles não existe um resultado satisfatório de aplicação da justiça. Independentemente de os seus protagonistas serem ou não culpados, o problema é que ou não se prova a culpa de quem cometeu esses crimes ou, se prova, para a grande maioria dos acusados, as consequências não se traduzem no cumprimento da mesma. Muitos processos ficam esquecidos nas calendas a”marinar” até prescrever ou tornam-se inconclusivos e são arquivados.
Um traço comum em todos eles: envolvem gente poderosa, com dinheiro e capacidade de exercer influência na alta esfera social e política. Outro traço comum: a Justiça parece ser muito benevolente com estes protagonistas, atitude nem de perto nem de longe, equivalente ao que ocorre com a “arraia miúda”, ou seja, quando o alegado criminoso é o “Manel das Iscas”.
A minha explicação para estes casos e para o aberrante funcionamento da justiça do seu julgamento é simples: é um problema cultural.
1º Os protagonistas envolvidos nestes casos e a gente dos tribunais emergem de uma sociedade que convive e pratica a corrupção como uma coisa normal.
Portugal é um “país da cunha” propenso a um tipo de corrupção de “favor” e do "mexer de cordelinhos", atitude enraizada socialmente ao longo do tempo, através da troca de favores, de “atenções”, de benefícios e facilidades. De qualquer modo, durante décadas esta era a via mais expedita perante “um aparelho de Estado lento e insensível aos problemas dos cidadãos, de difícil acesso e inibidor da iniciativa privada". Os pobres também “bajulavam” os mais ricos da sociedade por vezes na ânsia de que estes lhes proporcionassem uma simples promoção social ou que, de alguma forma lhes facultassem algum benefício na vida. O suborno é assim tido como normal.
Só esta tolerância explica, por exemplo, a recondução de Isaltino Morais para o cargo de presidente da Câmara pela população de Oeiras, depois de estar acusado e ter sido considerado culpado pelos crimes de corrupção passiva, fraude fiscal, branqueamento de capitais e abuso de poder. E ainda mais paradigmático é o facto de as leis portuguesas permitirem que uma pessoa nestas condições possa exercer um cargo público.
2º Os tribunais de alguma forma protegem quem tem dinheiro e poder, não se percebendo de forma clara a razão por que isto acontece, se a lei é igual para todos os cidadãos. Os arguidos que estão no lote dos influentes contratam os melhores advogados a peso de ouro. Estes sabem servir-se habilmente das leis para encetarem uma série de acções dilatórias que acabam por tornar o processo completamente inócuo. Os tribunais aparentemente são impotentes para combater esta tendência. Claro que pelo meio arranja-se sempre um bode expiatório, o elo mais fraco, que paga as favas dos outros a título de exemplo.
No caso Face Oculta por exemplo, estou plenamente convencida de quem vai pagar as favas é o Manuel Godinho, não obstante não ser propriamente “peixe miúdo” é, apesar de tudo, o elo mais fraco. Lembrou-se de oferecer prendas a gente influente para governar a sua vida. Já o Sr. Armando Vara desconfio que nada de especial lhe acontecerá. Mas vamos ver. E já agora: O que será feito de Dias Loureiro? Alguém sabe o resultado da badaladérrima Operação Furacão, relacionada com fraude fiscal? E o Vale e Azevedo, cadê?

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

NERVOS, PÂNICO E DESESPERO

Tudo se tem estado a precipitar com o caso grego e os acontecimentos da cena política e social sucedem-se em roda livre, já ninguém conseguindo antever cenários nem medir as consequências do que está para vir, seja lá ele o que for.
Se é verdade que, à primeira vista, Papandreau teve uma atitude desleal em relação aos seus parceiros europeus quando, num acto de dramatismo próprio de uma tragédia grega clássica, fez anunciar a realização de um referendum sobre a continuidade da moeda única no país, quando nada fazia prever uma hesitação política, face à aprovação ao perdão de 50% da dívida grega por parte dos dirigentes da zona euro, o certo que é que este golpe doméstico grego, para além de pôr em verdadeiro estado de sítio e à beira de ataque de nervos a Europa dos 27, lançou o pânico à escala mundial e colocou a crise grega e do euro no centro do debate da cimeira dos países do G20.
Tudo indica agora que muito provavelmente a atitude de primeiro-ministro grego não passou de dilatória, com o fito de neutralizar o principal partido da oposição e tentar ganhar fôlego político em condições conjunturais e de anti-popularidade extremamente adversas, com os gregos afogados nas medidas de austeridade e revoltados com a UE e com a Troika, a verdade é que o mundo tremeu como um pudim de gelatina prestes a desabar com esta ameaça grega.
Na realidade, os gregos têm direito de escolha mas o que não parece é que tenham alternativa, pois dependem dos dinheiros do FMI e do BCE como o pão para a boca, literalmente, e a saída do euro seria a banca-rota da Grécia e significaria o caos social e económico naquele país.
Porém, se a Grécia está refém da UE, o mundo está refém da Grécia. É que apesar de a Grécia representar apenas 2% do Produto Interno Bruto da economia europeia, o edifício financeiro da economia global é feito de barro e a Grécia é um tijolo que se for retirado pode fazer colapsar e desabar toda a estrutura, pois o efeito “dominó” resultante da rotura do euro por parte da Grécia propagar-se-ia a todo o mundo e seria imediato. Pelo menos é o que dizem os entendidos…
Este fenómeno de interdependência económica e financeira não deixa de ser curioso. Imaginem que um dia alguém algures num país decide dar o “grito do Ipiranga” e achar que este sistema não serve e já não responde às aspirações de um povo, e que esse alguém consegue mobilizar uma nação a remar contra a maré?
A verdade é que a revolta já começou e vive-se um clima de inquietação e desespero no mundo. Veja-se por exemplo os acontecimentos que estão a ocorrer nos E.U.A. em que Oakland está a ferro e fogo e os telejornais revelam imagens de desordem nas ruas que há muito não se viam neste país, com adeptos do designado “movimento Occupy Wall Street”, de reacção contra os mercados financeiros.
Remetendo-nos à história bíblica do “David e Golias”, o Golias que se cuide.