terça-feira, 11 de outubro de 2011

O SONHO EUROPEU OU O PERDÃO DA DÍVIDA (II)

O plano de assistência à Grécia e o respectivo receituário de medidas de austeridade já leva um ano e meio. Supostamente e previsivelmente já deviam estar a entrar no bom caminho, mas a realidade é bem diferente.

O último semanário Sol refere que “segundo os dados divulgados pelo Ministério das Finanças grego, o défice orçamental de 2011 deverá atingir os 8,5% do Produto Interno Bruto (PIB) este ano, longe dos 7,6% acordados com a ‘troika’. Para 2012, as previsões apontam para um défice de 6,8% do PIB, enquanto a meta era de 6,5%. A contracção da economia será maior do que o esperado e subirá 5,5% do PIB, em vez dos 3,8% previstos.”

Conclusão: nada destas medidas “troikistas” está a dar resultado. Todas as previsões têm saído frustradas. Entretanto a CE, o BCE e FMI aprovaram mais uma tranche de ajuda para não deixar cair a Grécia e estancar por agora o terrível efeito sistémico que se antevê se o cenário de colapso económico daquele país se concretizar. Porém, face à má execução do plano da “Troika”, e à tendência recessiva verificada e comprovada ao cabo deste ano e meio, a pergunta que se impõe é esta: Até quando se vai insistir neste receituário, que em vez de tratar o doente o vai aniquilando progressivamente, e está a pôr os povos à beira de um ataque de nervos social?

A única forma de salvar esta situação centra-se no perdão da dívida o que passa inevitavelmente pelo reconhecimento por parte dos “Srs. Mercados” que muito do dinheiro investido no tempo das vacas gordas é irrecuperável, isso mesmo.

À Comunidade Europeia caberia tomar as rédeas de um processo de recuperação económica centrada numa planificação de financiamento sustentável aos países membros em dificuldades, contemplando o perdão de uma parte da dívida, por um lado, e proceder a um programa de financiamento orientado para a recuperação económica capaz de criar riqueza em níveis que compatibilizem, de forma equilibrada, o crescimento económico e a amortização da dívida a longo prazo, partindo obviamente de novos padrões de funcionamento da actividade económica susceptíveis de garantir uma forte regulação dos mercados. Querer tudo ao mesmo tempo é que me parece a quadratura do círculo, pois já se percebeu que crescimento e austeridade severa para reduzir défices enormes no curto prazo, não são situações compatíveis e jogam em sentidos diametralmente opostos.    

Porém, enquanto os dirigentes políticos forem reféns dos mercados, não podemos ter outra expectativa que não seja uma penosa caminhada para o abismo onde nos iremos todos estatelar, num comboio em descarrilamento em que uns países arrastam os outros. Prémio de (des)consolação: não serão só os gregos ou os portugueses; ninguém vai ficar imune, suponho eu. Por isso, preparem-se que pode estar para vir o pior, se a orientação da crise dos países devedores continuar teimosamente neste rumo.

domingo, 2 de outubro de 2011

O SONHO EUROPEU OU O PERDÃO DA DÍVIDA (I)

O sonho europeu que aspira a um continente com uma moeda forte e próspera do ponto vista económico, com uma sociedade livre e solidária, alicerçada numa democracia alargada, com respeito pela soberania e diversidade dos povos, entrou em crise existencial, porque como diz o povo: “Casa em que não há pão todos ralham e ninguém tem razão”.
Durante décadas, numa euforia colectiva, o sistema financeiro através das instituições bancárias, foi injectando dinheiro na economia sem cautelas, num exercício parecido ao jogo de roleta de casino: apostar muito para ganhar muito mais. Os países mais pobres, como Portugal, tiveram acesso a grandes quantias de dinheiro que lhes permitiram modernizar-se e retirá-los do atraso em relação aos seus parceiros mais ricos. Os países ricos da Europa tiveram a sua oportunidade produzir e vender mais em novos mercados ávidos de consumismo e agora com dinheiro abundante, sem restrições alfandegárias e sem obstáculos de políticas proteccionistas nacionais e regionais.
Dinheiro em abundância, crédito fácil, juros baratos formaram o “caldo de cultura” propício ao consumismo de “novo riquismo” colectivo e satisfizeram a ganância e a ambição de muitos durante tempo demais. Muito desse dinheiro e do lucro que produziu não serviu para reinvestir e criar mais riqueza, simplesmente desapareceu e é irrecuperável em toda a linha, sector privado e público incluídos. Uma boa parte desse dinheiro foi para carros, casas, viagens, jantares, objectos tecnologia de ponta, foi para a corrupção e favorecimentos, para estradas e obras públicas de fachada para angariar votos, muitas sem utilidade, e muitíssimas sem racionalidade. Resumindo, uma fatia substancial dos recursos consumidos transformou-se num monte de sucata ou, simplesmente, evaporou-se. Esse dinheiro, essa seiva, não se traduziu em lucro mas em desperdício.
É obvio que o deslumbramento provocado pelo dinheiro é algo de que todo o ser humano padece, mas há um momento em que chega a factura e o credor bate à porta. Chato! A vida podia ser tão boa!   
Mas a realidade é esta: o crescimento e a ambição não podem ser ilimitados, simplesmente porque o próprio mercado não absorve o ritmo desenfreado e o planeta Terra não aguenta este galope delapidador.   
Sem deprimir, olhemos para as nossas vidas cheias de futilidades, a forma como encharcamos os nossos filhos com tudo o que não tivemos e o que compramos sem ser preciso. Pensamos que vivemos melhor, mas somos mais felizes? O que é excessivo não implica mais felicidade, apenas pode representar um prazer efémero, normalmente esgotável a muito curto prazo.
Durante muito tempo foi-se construindo progresso sobre um retorno futuro, repetiu-se a fórmula e repetiu-se novamente. Mas, porque o futuro é errático o processo redundou num colapso porque o futuro retorno foi ficando cada vez mais longínquo. A certa altura o dinheiro já não chegava para pagar as contas do presente quanto mais as do futuro e o problema avolumou-se de tal maneira originando o “crash”. E cá estamos nós em plena CRISE.
Chegados aqui, a crise transformou-nos em “pobres” a viver entre a espada e a parede e está a levar os “ricos” à loucura.  Porque os ricos que emprestam o dinheiro para este carrossel ainda não assumiram que a dívida é impagável. Por isso os “mercados” andam “tão nervosos” e até já há ricos que querem pagar mais impostos. Não será a intenção tão boa como parece, até porque não resolveria o problema, senão resultará antes da necessidade de tentar acalmar a populaça, não vá esta agitar-se em demasia com as injustiças sociais.
Assim, a resposta tem sido obrigar os governos a impor recessão aos povos. Como não está a funcionar soma-se mais recessão à recessão. Assim chegamos à Grécia, a Portugal, a Espanha, a Itália e sabe-se lá onde isto poderá ir parar. Preparemo-nos pois se a Europa não acordar a tempo a solução não vai passar por aqui. O sonho europeu afinal está a esfumar-se com a ambição de um ”jogador” ávido, que não quer perder nem a feijões.