terça-feira, 18 de março de 2014

A REESTRUTURAÇÃO DA DÍVIDA


Tudo se disse e tudo foi posto a nu nas reações originadas pelo já célebre manifesto dos 70 para a reestruturação da dívida.

Não vou aqui entrar em demonstrações sobre a necessidade da reestruturação, porque isso está bem claro no manifesto e em muito do que se tem dito e escrito, até porque não tenho domínio técnico na matéria. Vou direta áquilo que quero expressar e é minha opinião.

Em primeiro lugar saliento que não é comum, ou é mesmo muito invulgar que uma série de pessoas credíveis de um leque alargado do espetro político e social, numa atitude de diálogo tivesse convergido num consenso e com ele viesse marcar uma posição refletida relativamente ao rumo que o país deve atalhar, ou tentar atalhar, através da negociação com os parceiros económicos e credores, para recolocar o país numa via de crescimento sustentável. Facto notável que denota uma capacidade inusitada de diálogo e de responsabilidade participada na coisa pública, um verdadeiro ato de cidadania.

Obviamente que a classe política, especialmente o primeiro-ministro, pouco habituada a iniciativas emergentes de outros quadrantes que não da sua esfera de poder em sentido estrito, vêm nesta atitude uma invasão aos seus domínios, e desconfiam de quem se atreve a tais investidas atentatórias das suas políticas inquestionáveis. Sobretudo o primeiro-ministro, porque esta tem sido a política que espelha a sua visão pessoal do país e para o país. Ou tem vistas curtas ou tem rabos de palha! Talvez não consiga ou não saiba fazer melhor. Seja qual for a motivação ele está convencido que este é o caminho.

Já estamos habituados a que nos tentem vender a ideia de que não existe “Plano B” que o caminho a trilhar não tem alternativa de percurso e o nosso futuro depende do rumo que nos querem impor, a pretexto de que, se assim não for, o país implodirá.

Todos sabemos que isso é falso e em política há sempre alternativas. Também é verdade que tudo tem um preço, consequências, resultados… O que me importa a mim e aos meus compatriotas que dão o corpo ao manifesto por este país de forma honesta e trabalhadora, é saber o que é mais justo e mais assertivo em prol do interesse nacional e do país no seu todo, não estou a falar do país refém de grupos fechados ao serviço dos interesses dos mercados especuladores, numa espécie de economia feudal instituída. Quem já por cá anda há alguns anos sabe o que é a propaganda, sabe que o que se diz não é o que se faz e o que se faz não é o que deveria ser feito, pese embora seja apresentado como A SOLUÇÃO ou a POLÍTICA CERTA.

Querem-nos bem comportados, o mesmo é dizer, querem-nos com medo. Medo de quê? De ficarmos pobres? Mas já somos! De ficar sem trabalho? Mas já não temos. Que não nos emprestem dinheiro? Não! Porventura temem que um dia não precisemos de dinheiro emprestado! Querem-nos pobres q.b. porque os pobres são quem paga juros altos para ficarem ainda mais pobres e pagarem mais juros e ainda mais altos! Mas sem nos tirarem completamente o ar, dão-nos um canudo para ir respirando devagarinho. Portugal pobre é um bom negócio, não produz porque não tem dinheiro para investir, por isso tem que comprar o que consome, paga mais pelo que pede emprestado e é obrigado a pedir mais emprestado para pagar o que deve. Este é o paradigma dos mercados. Por isso nos querem bem comportados. A ditadura do século XXI é a subjugação dos povos aos mercados.

Por isso, quando alguém se levanta, da esquerda à direita, e reclama que este não é o caminho e as condições para pagar a dívida devem ser renegociadas de forma a aliviar o garrote a que nos submeteram, todo o edifício treme, com ameaças de que vai ruir. Não vai; está a ruir e vai ruir se não se fizer nada para o evitar.
Não se trata de perdoar a dívida, mas de rever as condições para a pagar sem sufocar a boa gente. Pois se a dívida existe, alguém a contraiu, e se esses não a pagam, como já se percebeu, e temos que ser nós contribuintes a pagá-la, quem nos representa que nos represente e nos defenda das garras do capitalismo selvagem em vez de nos sacrificar às mãos desses carrascos. Numa sociedade civilizada e alegadamente democrática, que eu saiba, as pessoas ainda contam e o dinheiro não é um valor em si. O valor está em quem trabalha e produz riqueza.

Fui das que achei o resgate uma solução de recurso inadiável depois do atoleiro em que estávamos metidos. Mas ao cabo deste tempo está mais que demonstrado que o tratamento de choque tem que dar lugar uma terapia de recuperação. Caso contrário a situação do país agravar-se-á numa morte lenta mas cada vez mais rápida, como demonstra o agravamento da dívida portuguesa: o ponto de chegada acaba por ser pior que o ponto de partida, com a agravante que o país estará mais exaurido para poder recuperar, sem dinheiro e sem gente.

Neste grupo de subscritores, ao lado do qual eu me posiciono, não perceciono ninguém que queira mal ao seu próprio pais. Nós somos o país! Para o bem e para o mal! O momento não é oportuno? Nunca foi tão oportuno… O primeiro-ministro é que não quer ou não sabe fazer diferente!

domingo, 6 de outubro de 2013

AUTÁRQUICAS

Não extrapulo resultados de eleições autárquicas para formular qualquer conclusão sobre julgamentos à governação do país.

As autárquicas são por excelência as eleições em que a relação de proximidade entre eleitores e eleitos é clara. Os eleitores reconhecem os que lhes são próximos e quem acham ser capaz de os representar, assim como rejeitam alguns paraquedistas de serviço que pululam nos meandros dos partidos, na busca de oportunidade de mais um cargo, com garantia de poder para a sigla do partido respetivo. As escolhas partidárias dos nomes a encabeçar as listas são por isso determinantes para o resultado final, não tenhamos a menor dúvida.

Os resultados das autárquicas espelham uma dinâmica local que os partidos, cada vez mais alheados do contexto sociocultural e das populações, muitas vezes não sabem compreender. O escrutínio dos eleitores centra-se assim nos candidatos em si mesmos.

Pensemos em primeiro lugar na abstenção. Segundo os dados divulgados no “site” da Direção Geral da Administração Interna, registou-se nas autárquicas de 2013 a maior taxa de abstenção alguma vez ocorrida neste tipo de eleições desde o 25 de Abril – 47,4%. Em 2009 tinha sido 41%. Se juntarmos os votos brancos e nulos, metade dos portugueses eleitores não vota em nenhum candidato. Isto significa uma coisa: os portugueses estão cada vez mais descontentes com o rumo da política e não se revêm nos candidatos. Reforço “descontentes”, não se tratando, no meu entender, de alheamento.  Nunca os portugueses estiveram, como estão agora, tão atentos e informados sobre o desempenho dos atores políticos.

Em segundo lugar, verifica-se uma tendência, ainda tímida, mas apesar de tudo muito clara, dos candidatos sem sigla partidária. Os movimentos independentes estão em ascensão e embora saibamos que muitos dos ditos independentes ou grupos independentes emanam dos partidos políticos com os quais entraram em processo de cisão, ainda assim tal significa uma perda de influência dos aparelhos partidários. O caso mais paradigmático será o Porto, sendo que os movimentos sem sigla ganharam em 13 Câmaras do território nacional, mais do dobro do que se verificou nas autárquicas de 2009, tendo os grupos de cidadãos elegido 113 mandatos, 6,9% dos votos, o que já é significativo.

Pessoalmente não vejo nenhum problema ou demérito numa candidatura de dissidência partidária. Quem está num partido tem toda a legitimidade em divergir quando não se revê no desempenho do mesmo. E a verdade é que os partidos estão cada vez mais fechados sobre si próprios e vivem para a sua pequena comunidade de históricos membros distanciando-se na atitude dos seus próprios ideais de construção da sociedade. A dissidência é uma rampa de lançamento para a atividade política extrapartidária, que a médio longo prazo acabará por contaminar a sociedade civil, espero eu. Por si só, um independente não tem que dar necessariamente um bom político, mas um grupo de cidadãos independentes na política participativa e ativa traduz um progresso democrático e há que arrepiar caminho por algum lado. Como se sabe, até há pouco tempo a oportunidade de candidaturas independentes era vedada por lei e hoje em dia muita luta desigual se trava no terreno, gozando os partidos de uma infinita vantagem e proteção institucional face aos movimentos de cidadãos. Os partidos políticos, que ainda têm o monopólio na Assembleia da República, legislam de forma a protegerem-se. Mas o caminho faz-se caminhando e isto ainda vai mudar, por pressão da sociedade civil.

Uma terceira abordagem centro-a nos casos dos “transumantes” de concelhos, o que também pode ser objeto de uma análise curiosa. É que de um modo geral, estes casos foram claramente penalizados pelo escrutínio eleitoral, á exceção de uma minoria. Dos que se incluem nesta minoria, certamente terá prevalecido algum mérito pessoal dos candidatos que acolheram a aceitação na porta da casa ao lado. Aqui os eleitores deram um sinal para a clarificação da célebre lei da limitação de mandatos, que ninguém com responsabilidades quis dar. A falta de coerência e transparência do costume dos senhores deputados.

A análise dos resultados eleitorais das autárquicas é sempre complexa e não pode ser generalizada, já que ocorrem muitos e diversos fatores em razão de cada local. No entanto, deixo aqui a minha reflexão muito geral sobre o panorama eleitoral do passado domingo. Uma ressalva apenas para aquele que considero um caso de estudo nacional: o concelho de Oeiras, em que um presidiário consegue “eleger-se” por interposta pessoa e à revelia de qualquer força partidária. Não há dúvida que o homem é “especial”!

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

ESPERANÇA...


O governo e o primeiro-ministro vêm anunciar que há sinais de recuperação económica…

Estamos nas 8ª e 9ª avaliações da TROIKA. De acordo com alguns dados a que tive acesso, os indicadores das políticas seguidas durante o período do resgate são:

1.       Dívida pública em crescendo, à data de Junho de 2013 avaliada em 214,57 mil milhões de euros; - 130% do PIB (segundo o último relatório do Banco de Portugal); Comparando com os dados da PORDATA desde o início de 2012 até meados de 2013, em apenas um ano e meio a dívida cresceu 22,6 %;

2.       Dívida global (pública + privada) avaliada em mais de 400 000 mil milhões de euros;

3.       O Produto Interno Bruto, em dois anos, 2011 e 2012, desceu de 171 046 mil milhões de euros para 165 409 mil milhões de euros, ou seja uma quebra de 3,3% (dados da PORDATA)

4.       Desde 2008, ano em que se declarou a crise financeira até à atualidade fecharam 246 761 empresas contra apenas 173 256 que foram criadas durante o mesmo período. Até 2007 a tendência era justamente a inversa. (segundo dados do Observatório Racius);

5.       Taxa de desemprego a rondar os 20% da população ativa e 40% da população jovem que está a entrar no mercado de trabalho;

6.       Doze mil milhões de euros, uma fatia de 15% do dinheiro do resgate, destina-se a cobrir imparidades, ou seja, vai para recapitalização dos bancos para buracos como o do BPN! 40% (?) são para pagar juros da dívida e dívida, não obstante esta continua a aumentar, bem como as metas do défice estão longe de ser cumpridas. O restante dinheiro destina-se a fazer face a despesas do Estado e apenas um valor residual entra como investimento na economia.
Estes são alguns indicadores pouco tranquilizadores, melhor, muito inquietantes, que Portugal tem para apresentar.
A política de austeridade e de cortes cegos tem-se traduzido da seguinte forma na sociedade portuguesa:

1.       Para fazer face ao desequilíbrio das contas o governo aumentou desmesuradamente impostos, retirou subvenções sociais, cortou nos salários, nas reformas, na cultura, na educação…

2.       Existem cerca de um milhão de desempregados e trezentos mil estão em situação de trabalho precário;

3.       Com redução drástica de recursos financeiros as famílias perderam uma boa parte do seu poder económico, quando não se debatem já com sérios problemas de subsistência;

4.       Com um quadro económico e político instável, os investidores não investem em Portugal;

5.       Sem trabalho, os imigrantes partem e os portugueses emigram, contribuindo para a desertificação e envelhecimento da população.

6.       O país perde “massa cinzenta” porque os que agora emigram são os mais qualificados e dinâmicos, em cuja formação o país investiu mas não aproveita.

7.       Gente altamente qualificada vê-se forçada a aceitar tarefas não qualificadas e baixos salários.
Não se constrói um país nestes moldes, vergado ao peso da “soberania” de uma dívida que em última análise resultou de má gestão e irresponsabilidade de sucessivos governos e da banca, empenhada no assédio e em facilitismos sistemáticos ao endividamento do Estado, das empresas e das famílias. A mesma banca que agora se financia através do estado, que somos nós contribuintes.
Por outro lado, é de senso comum que para haver emprego têm que existir empresas, dado que o Estado por si só, NÃO PODE, NEM DEVE ser o principal empregador. Isso representa uma carga financeira que a sociedade civil não consegue sustentar.
Quem contribuiu para o atual estado de coisas goza de uma impunidade obscena, que nos revolta e envergonha a todos.
Um país não se constrói vergado a uma dívida que subjuga a população e retira dela recursos para os dirigir aos bolsos de credores, que assim retiram lucros imorais e astronómicos, à custa do erário público.
Não se constrói um país com empobrecimento real, intelectual e moral. Reduzir o povo a pagador da dívida, é esmagar a nação e remeter o povo à escravatura da nova era. Uma nação escravizada é uma nação sem esperança.
Portugal é neste momento um país sem esperança.
Dizem-nos que devemos ser nós a dar a volta à crise, sendo criativos e empreendedores!
Desculpem?! Ser criativo e empreendedor é uma mais-valia, mas o país tem que dar condições e oportunidades que desenvolvam expetativas de vida positivas, ou seja, ESPERANÇA, que nos dê a nós, Portugueses, a força anímica para ser criativos e empreendedores.
Não sei como vamos sair disto, mas sei como muitos dos meus compatriotas sabem, que este não é o caminho.
Há que negociar com os parceiros europeus a dívida em benefício prioritário do interesse nacional, preservando a sustentabilidade económica e a dignidade das pessoas. É isso que deve estar na mira dos governantes de hoje e de amanhã. Para não chegarmos ao ponto de ser resgatados apenas pela ótica dos credores a quem um país exaurido já não lhes rende.
É de crucial importância que nunca, mas nunca mais, o país caia nas mãos de gente irresponsável que nos conduza a situações de colapso financeiro como aconteceu até aqui.
Há que corrigir os desequilíbrios que beneficiam quem tem o poder económico, as grandes empresas com monopólios de mercado, os bancos, e quem está instalado nos grupos de influência com penetrações no poder político. Há que combater a corrupção, pôr a justiça “mais justa” e a funcionar, há que governar para as pessoas não para satisfazer interesses agiotas.
Há que reformar o Estado, o que não se limita a fazer uma purga com despedimentos a granel, mas antes com critério, racionalidade e orientação quanto ao papel a desempenhar pelo Estado na sociedade. Onde é que esta discussão está a ser feita com seriedade?
Governa-se para a TROIKA ver, apenas e só, medidas avulsas e contas de merceeiro.
Não acho que se deva responsabilizar a TROIKA, eles desempenham o papel que lhes compete e este não é o seu país. Devemos responsabilizar os governantes passados pelo descalabro a que nos fizeram chegar, os atuais pelo embuste, até agora pela incapacidade negocial e pelo desconhecimento do país real, pela imoralidade e pela incompetência na aplicação de políticas que preservem o equilíbrio do tecido produtivo, o respeito pelos cidadãos e a dignidade humana.
Não podemos pactuar com governantes cujo discurso tem como único objetivo levar à desintegração da coesão social para levar a cabo medidas desastrosas, colocando em oposição e confronto, como se de fações inimigas se tratasse, privados e funcionários públicos, jovens e velhos, pensionistas e trabalhadores. Discursos falsos que induzem a população em preceitos errados e promovem a desunião. Chamar requalificação aos despedimentos, ajustamento ao empobrecimento, dizer que vivemos acima das nossas possibilidades ou invocar recuperação económica quando o que se observa é a destruição do tecido empresarial, é pura perfídia de linguagem. Não nos tentem iludir porque sabemos perfeitamente que o país está a andar para trás. Tais discursos são um atentado diário à inteligência dos portugueses. Em política vale tudo por um punhado de votos. Mentira, má despesa, demagogia, e até imbecilidades, tudo vale. Esta gente não evolui, não respeita.
Senhores, estamos fartos. Queremos a nossa esperança de volta, que por aqui anda perdida. Procuremos união para as nossas próprias soluções e oxalá encontremos saídas. O tempo é de resistência e de luta feroz. Boa sorte a todos enquanto cidadãos empenhados.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

LIBERDADE

Cresci e vivi toda a minha vida em liberdade. Não conheço outro modo de vida!
 
O 25 de Abril de 74 aconteceu era eu ainda criança, mas já com discernimento suficiente para entender o que se estava a passar. Pela primeira vez ouvi então as palavras “democracia” e “fascismo”. Fiquei a perceber o conceito de uma e de outra. Termos como “revolução”, “igualdade”, “fraternidade”, “liberdade”, passaram a ter um significado diferente, mais politizado. Fiquei a saber que existia uma PIDE e entendi o significado das palavras “repressão” e “ditadura”.
Antes do 25 de Abril estes conceitos não existiam para mim, eu apenas brincava. E tinha toda a liberdade para isso. Não me preocupava com a vida. Vivia protegida das maleitas do mundo e todas as minhas necessidades e conforto estavam assegurados. É certo que na escola convivia com meninos e meninas muito pobres, que andavam de pés descalços e sempre ranhosos e sujos. Que, de quando em vez, havia um funeral na terra, de alguém que vinha do Ultramar para regressar à sua casa, agora como última morada, e havia famílias chorosas de perdas irremediáveis, vidas que a guerra ia ceifando. Mas eu não percebia. A vida era linda para mim. Pode-se dizer que era feliz, porque era livre e, na minha cabeça, o mundo era bom e representava um manancial de descobertas fantásticas.
Entretanto deu-se a Revolução dos Cravos. Quando entendi o verdadeiro significado da palavra “Liberdade”, e fui ganhando consciência política e social, percebi que a liberdade não é só até ao nosso umbigo. Fiquei a conhecer a razão por que um tio desaparecia de circulação de vez em quando. Ele tinha sido preso político e esteve privado da sua liberdade de pensamento, de expressão e de si próprio, durante muito tempo. E que um primo esteve na guerra porque a tal foi obrigado. O “proibido” e o “obrigatório” afinal não era algo que se traduzia apenas em pequenas contrariedades para disciplinar o nosso comportamento e nos tornarmos melhores pessoas. Era algo muito mais grave e persecutório. Significava medo, repressão, tortura e até morte.
 
Quando ganhei consciência o país já era livre, vejam só a minha sorte! Agradeço isso aos capitães de Abril, independentemente das suas motivações à época.

Depois de todos estes anos passados em democracia, podemos perguntar: Que liberdade temos, afinal? Temos muita, comparativamente ao que era antes da revolução. Mas temos muito pouca se analisarmos a forma como a nossa sociedade se organiza e observarmos as circunstâncias políticas e económicas em que vivemos que nos obrigam a seguir determinados modelos, mesmo sem nos revermos neles, o que é bastante atentatório da nossa liberdade.
Quem chega à governação depende dos grandes grupos económicos; os partidos hegemonizam a política e procedem para ser eleitos, captando a simpatia dos grupos económicos e mentindo ao povo. O poder assenta na falsidade e no dinheiro pelo dinheiro para subsistir, num cartel em que as pessoas e os valores humanos contam muito pouco. As pessoas servem para pagar as contas que o governo e os grupos financeiros em equipa nos atiram à cara, sem escrúpulos. Neste caldeirão cabe tudo: corrupção, clientelismo, laxismo político, irresponsabilidade na gestão das contas públicas, incapacidade de resolução dos problemas reais da economia e da sociedade, incompetência e impreparação política e cívica, desvalorização do interesse nacional em favor do interesse particular. O sistema financeiro instituído não tem escrúpulos e dá estrategicamente com uma mão para tirar com a outra, sem contemplação. Todos sabemos que é assim. Quem trabalhou honestamente uma vida inteira pode ver sonegados, o mesmo é dizer, confiscados, todos os seus bens e haveres. É fácil atirar um cidadão desprotegido para a pobreza. Basta uma lei. Tão simples e tão desigual, na medida em que o elo mais fraco não tem capacidade de ripostar, ou de se fazer ouvir, e será sempre, e sem contemplação, o prevaricador, se não cumprir ou… se não puder cumprir. Isto, meus amigos, é prepotência e repressão. Como é abusivo quando nos assediam, por qualquer via e sem respeito pela privacidade, para nos endividarmos ou para consumirmos o que não precisamos.
 
Vivemos e trabalhamos para pagar as contas, as que contraímos e as que não contraímos. Vivemos rodeados de credores; mesmo quem nunca contraiu dívidas, é devedor. Isto é escravidão, porque nos retira espaço para viver e reduz o sentido da vida, transformando-nos em simples peças de engrenagem do materialismo selvagem manipulado pelos “mercados”, sem outros valores que nos elevem. Isto é asfixia, é aniquilação, é privação de liberdade. Alguém sabe definir “os mercados”? Têm rosto? Elegemos quem tem este poder de regular as nossas vidas. NÃO! Então onde está a democracia e a liberdade?

Cada um de nós deve ser livre e poder dizer que não quer o que lhe querem impor, que seja atentatório da sua liberdade como ser humano íntegro e digno. Ditadura nunca mais, seja qual for a sua forma. 25 de Abril significa esperança. E onde está ela? Que esperança temos para as nossas vidas e para as dos nossos amados filhos? E que podemos fazer para mudar? Qual pode ser o nosso contributo?
Sempre achei que o espírito da revolução começa em cada um de nós. Felicidade não existe sem liberdade. E sem esperança só há desalento. No fundo, é tudo uma questão de consciência e de sobrevivência. Sem liberdade não se pode viver, só se pode vegetar, que o mesmo é dizer, morrer. Compete a cada pessoa, a cada cidadão, encontrar a sua forma de luta sem nunca desistir para preservar a sua liberdade e a dos seus concidadãos.
25 DE ABRIL, SEMPRE.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

O FIM DO MUNDO

Segundo a predição Maia, povo sábio e respeitável civilização, o mundo acabar-se-á no final deste ano, mais exatamente no dia 21 de Dezembro (faltam 4 dias).
Pois para quem está à espera de um qualquer cataclismo natural que nos dizime a todos ou faça o mundo implodir, não sei se por intervenção de divina graça ou por causa de um simples e fortuito erro de cálculo daqueles nossos antepassados ancestrais, para nossa felicidade, os mensageiros da desgraça vão ter uma enorme deceção, coitados!
No entanto numa ótica menos fatalista, à qual não sou dada, e porventura mais esotérica, consta que a data marca o início da Nova Era e que o planeta Terra e os seus habitantes racionais podem sofrer uma transformação espiritual positiva.
Pois se não levarmos a interpretação à letra, penso que a predição não estava de todo errada e até acho muito assertiva.
O que me parece vislumbrar do que vejo e assisto é que o mundo tal como o conhecíamos até aqui, acabou ou está em processo de extinção embora não consiga nem ter uma remota ideia do que virá a seguir, se é que virá alguma coisa nova, pois não devemos excluir a hipótese de voltar tudo sempre ao mesmo sistema arcaico, uma vez que o bicho homem é um bocado duro de aprendizagem quando isso mexe com a sua situação instalada e forma egoísta de ser.
E desculpem-me esta abordagem megalómana dos eventos, a qual não tenho capacidade de abarcar no seu todo. Assim, na modéstia da minha pequenez cá neste mundo, cinjo-me aqui ao que alcança a minha escala de vida temporal e experiência adquirida por força de cá andar, circunscrita ao meu campo de observação mais direto, ou seja este pequenininho retângulo plantado à beira mar, o nosso universo se assim se pode dizer.
Assim, tanto quanto me é dado observar, este microcosmos à nossa volta está efetivamente a desabar em muitos dos direitos, liberdades e garantias conquistados com o 25 de Abril, batalha que todos julgávamos estar ganha e os seus louros adquiridos, numa sociedade, apesar de tudo, de abundância e bem-estar a que nos fomos habituando, pensando ser uma coisa sólida. Por força das políticas antigas seguidas durante anos e novas políticas agora aplicadas como terapia de recurso,
·         Destroem-se os setores produtivos e investe-se em consumo e obras de fachada para ganhar votos e sustentar poder;
·         O setor financeiro levou as pessoas a endividarem-se de forma insustentável, até à falência de muitas famílias e empresas que fecham portas em catatulpa;
·         A dívida pública cresce ainda que se esteja alegadamente a tentar combatê-la com políticas “troikanas” que nos fizeram entrar num círculo vicioso de contrair divida para pagar a dívida, sem setor produtivo a criar riqueza;
·         Perde-se o direito ao trabalho, este tornou-se um luxo de que muitos já foram excluídos;
·         Quem trabalhou e descontou uma vida, não sabe se alguma vez terá direito a uma reforma digna;
·         O futuro dos jovens está empenhado, no país que os viu nascer, restando-lhes emigrar;
·         A liberdade de prosperar por força do trabalho, foi-nos cerceada por um estado desgovernado ao longo de décadas, pela corrupção instituída e pela especulação financeira desregulada, consumindo recursos e desviando-os da economia real;
·         Perde-se o direito às coisas de nossa propriedade, conquistadas com trabalho de uma vida, as quais para muita gente se tornaram insustentáveis de manter;
·         Entrámos na era das execuções despudoradas e persecutórias, sem alternativa para os que estão na mó-de-baixo do sistema;
·         Vivemos na insegurança de perder as nossas economias de um dia para o outro bastando que o banco no qual depositámos confiança nos “estrapaceie” o dinheiro jogando na roleta de casino da especulação financeira;
·         Famílias em desespero, os velhos e os mais desprotegidos da população vêm-se cair numa situação de pobreza envergonhada, ficando na dependência da caridade alheia, com progressiva desresponsabilização do estado social.
Perante o mundo à nossa volta a desabar muita gente perdeu a esperança e sente um grande desalento porque, não obstante os protestos e a vozes de apelos de mudança a eclodir, tudo parece não ter solução.
A mim o que me apetece é hibernar. Parece até que estamos na estação apropriada para tal. Hibernemos, pode ser que entretanto nasça um tempo primaveril novo.
Os Maias tinham razão. O mundo está a acabar. Resta saber o que vem a seguir. Um bom 2013 a todos, passe o eufemismo.

domingo, 28 de outubro de 2012

REFUNDAÇÃO PRECISA-SE


Já vivo aqui há anos suficientes para começar a ter a ideia, mais ou menos consolidada, que Portugal não é um país a sério, apenas um simulacro.

Nessa perspetiva tenho sido apologista e sempre lutei pela REFUNDAÇÂO do país, no sentido de objetivar um país novo e reciclado, organizado e amigável para os seus cidadãos. No entanto, os defeitos tornaram-se instituições difíceis de erradicar, pela tenacidade dos interesses a quem este funcionamento anómalo interessa e perante a condescendência da população que aceita este "status quo" como normal.

Vir agora o primeiro ministro falar em “refundação” do programa de ajustamento até parece que vem a propósito, não fosse o próprio tê-lo dito como poderia ter dito outra coisa qualquer para transmitir algo que nem ele próprio sabe o que é, ou sabe, mas não quer dizer por enquanto para nos brindar daqui a algum tempo com uma surpresa daquelas que já vamos sabendo. Portanto não deve ser coisa boa, tanto mais que as reformas que o país realmente precisa, ele não vai ser capaz de as fazer, já se percebeu, não só porque muitos dos problemas são sistémicos e extravasam o âmbito nacional e ele não tem poder para mudar, como não tem capacidade para renegociar o que quer que seja nem cá dentro nem com os de fora, os parceiros europeus.

Refundar seria o quê, afinal? Algumas dicas:

1-       Acabar com a grande corrupção instalada, o que se consegue com rigor e ética e se complementa com uma justiça incisiva e célere. Não mais BPN’s, dias loureiros, valentins loureiros, isaltinos morais, vales e azevedos, e outros que tais, sacos azuis e promiscuidades entre clubes futebol, construtoras e políticos que estagiam na governação para ingressarem depois nas grandes empresas com proteção do estado (parcerias publico-privadas, pagamentos de rendas de compensação, que somam a lucros chorudos, enquanto cá fora destas crisálidas o país empobrece).

2-       Acabar com a pequena corruptela de vão de escada e com o expediente do favorzinho. As instituições prestam um serviço público e os funcionários são isso mesmo, devem funcionar de forma eficiente, não estão nos postos de trabalho para fazer favores a quem lhes paga os ordenados.

3-       Reformar em profundidade o sistema fiscal, erradicando definitivamente do léxico da atividade económica expressões como  “quer fatura?” ou “não passo fatura”e vedando a possibilidade de fuga de capitais para off-shores e paraísos fiscais a que apenas as grandes empresas e os bancos têm acesso. Se todos pagarem, todos pagam menos e haverá mais dinheiro disponível para a comunidade usufruir e para o país se desenvolver.

4-       Apetrechar o país com uma moldura legislativa composta por leis claras, objetivas, sem ambiguidades e complexidades, que apenas contribuem para o seu incumprimento ou inviabilizam a sua aplicação por excesso de zelo ou inadequação.

5-       O Estado e os governantes e os políticos em geral têm que ser exemplo de ética e de conduta. Não são admissíveis mais josés sócrates a contribuir definitivamente para arruinar o país ou sermos obrigados a ser (des)governados e a conviver com josés relvas que vivem no paradigma da “chico espertice” que mais não é que a desonestidade mais abjeta e aviltante.

6-       Erradicar a burocracia estupificante e paralisadora nas coisas mais elementares da vida do país, e simplificar procedimentos de modo a agilizar a vida das pessoas e promover a atividade económica. Tempo é dinheiro e as pessoas não são escravas para serem obrigadas a fazer serviços que não passam de formalidades sem utilidade nenhuma, que não seja justificar uma máquina administrativa que é um polvo, com muitos tentáculos e pouca cabeça.

7-       Repensar a função do estado de modo a que este não faça o que não tem que fazer e faça melhor o que são as suas obrigações, o mesmo é dizer racionalizar orgânicas e instituições, otimizando a sua distribuição e quantidade, bem como a coordenação de serviços, com critérios que não podem ser cegos, mas antes ajustados às necessidades do país, num contexto nacional que dê espaço à sociedade cívil para se expandir e ser ela própria o motor da economia e da iniciativa.

8-       Regular a atividade dos bancos e instituições financeiras e adotar mecanismos para acabar com a especulação financeira. O dinheiro deve ser reinvestido em setores que produzam bens transacionáveis de forma a produzir mais riqueza. Os bancos não podem funcionar com uma enorme rede de “Donas-Brancas” à escala global.

Se PPC e Vitor Gaspar fossem capazes de levar estas tarefas hercúleas a cabo, coisa que nem se vislumbra um apontamento, então talvez tivessem argumentos para negociar o memorando de entendimento e chegar à tal “refundação” de que fala o PM de forma enigmática (desconfiem). De outro modo, parece-me que a refundação vai traduzir-se em novos pacotes de austeridade e regressão cada vez maior do estado social. Por outras palavras, iremos pagar mais para ter de contrapartida cada vez menos. E esta atitude prepotente só tem uma de duas designações: ROUBO ou EXTORSÃO. Resta saber até quando estão os portugueses dispostos a serem roubados e extorquidos? Neste contexto já sou eu que digo: declarar rendimentos ao estado tornou-se um ato suicida e de insanidade. Quando o carrasco persegue a vítima só há um caminho possível: fugir, cada um por si.

Custa-me ter que reconhecer mas é este o rumo que o país está a tomar. Só quem é cego é que não vê.

domingo, 16 de setembro de 2012

O POVO UNIDO


Já aqui escrevi que discordava das novas medidas de austeridade. Na verdade, o benefício da descida da TSU para as empresas seria desejável, não fora esta medida contrariada com a medida oposta, que agrava em termos gerais a TSU, retirando mais dinheiro às famílias, oprimindo o consumo, logo, as vendas de bens e serviços das empresas que trabalham sobretudo para o mercado nacional, as quais representam 99% do tecido empresarial português. Muitas destas são empresas familiares ou individuais e são, na realidade, o posto de trabalho e o ganha-pão de quem as dirige. É pois falacioso que a medida venha contrariar o aumento do desemprego. Virá sim, mais uma vez, subtrair dinheiro à economia, empurrando-nos para uma recessão cada vez mais cavada. Insistir nesta fórmula começa a ser falta de lucidez, visto que não nos coloca na rota da recuperação económica nem na do cumprimento das condições do resgate financeiro, encarando a segunda meta como variável direta da primeira.  

Em condições tão adversas de cortes e mais cortes, já quase ninguém neste país ganha para pagar impostos, o Estado passou a comer connosco à mesa, quando não se trata mesmo de tirar o pão da boca de quem já não tem para se sustentar. Não se trata de dramatização. Infelizmente é a realidade.

Os portugueses já não aguentam, não acreditam na bondade dos sacrifícios e já não têm esperança. Perderam a confiança num governo e num primeiro-ministro, cujo discurso hoje não tem nem um vislumbre do que afirmou, na fase em que se apresentou ao eleitorado como o salvador da Pátria.

Num ato de protesto e de genuína indignação, os portugueses saíram à rua numa manifestação verdadeiramente espontânea e ordeira, em que pequenos episódios residuais de alguma tensão mais truculenta não ensombram a forma digna como as pessoas se manifestaram, entoaram palavras de ordem e choraram as suas aflições mais profundas e veladas. Esta é a voz do povo, dos cidadãos, das pessoas, que não são números, nem cifrões, nem meros contribuintes e têm uma palavra a dizer sobre o seu próprio destino. É esta a via mais espontânea que o povo tem para fazer ouvir a sua voz e fá-lo legitimamente contra a prepotência de que está a ser alvo, e do pacote de medidas que lhe despejam em cima, sem direito ao contraditório.

Os governos têm legitimidade para governar, mas não têm legitimidade para enganar as pessoas. Os portugueses disponibilizaram-se a pagar uma dívida pública que em boa medida não ajudaram a criar, mas ainda assim dispostos a salvar a pátria do descalabro da bancarrota e a sua própria reputação como nação. (Quem mais?) O que os portugueses exigiram a PPC e ao governo quando o elegeram foi rigor nas contas, competência na resolução de um problema bicudo, imaginação para encontrar as soluções eficazes no controlo do défice e da dívida, minimizando os impactos sociais que, já se sabia, ainda assim iriam ser penosos. Missão difícil, sem dúvida, mas quem se apresentou como alternativa de governação já sabia ao que vinha. Teriam que estar preparados. Porém, ao cabo de mais de um ano de governação, as contas estavam erradas e nunca são transparentes, os cálculos projetados saíram gorados e não existe uma estratégia que vise a recuperação económica do país. O que temos são uma sucessão imprevisível e em roda livre de medidas avulsas, fazendo lembrar o sufoco que foram os sucessivos PEC’s do anterior governo PS, na fase final que antecedeu a queda do governo Socrático.

Face aos resultados insatisfatórios, os portugueses questionam-se legitimamente e, cada vez com mais convicção, sabem que o rumo que o governo está a tomar não nos vai levar a bom porto.

Os portugueses, em união de todos os quadrantes políticos, classes e setores de atividade, deram ontem um sinal claro que não aceitam mais medidas de austeridade, não só porque já não podem pagar mais, mas sobretudo por que não acreditam nelas para nos tirar de maus lençóis. E esta é uma nota inequívoca de que, aos olhos dos portugueses, o governo está descredibilizado, revela-se incapaz de conter o défice e navega à vista. Em política há sempre alternativas e o caminho não tinha que ser este. Assim o governo e Pedro Passos Coelho tenham disponibilidade mental para colocar outras soluções em cima da mesa e para as negociar com a Troika, sem a obstinação de querer ser o bom aluno, quando isso se resume a mera engenharia financeira de merceeiro e ao empobrecimento e colapso económico do país. O que PPC tem que perceber é que os interesses que ele deve defender em primeira instância são os da gente, porque a gente é o país e não merece este castigo que lhe infligiram.